A rede britânica BBC é conhecida pelos seus programas de extrema qualidade. Seus documentários e séries são largamente exibidos em vários programas pelo mundo (que o diga o Fantástico). Da física quântica aos efeitos da poluição no planeta. Nada escapa ao excelente conteúdo da rede britânica. É sem dúvida uma televisão totalmente diferente do que estamos acostumados aqui. Leia-se: Conteúdo de Qualidade. Isso talvez possa ser explicado pelo fato de que na Europa, assim como em vários outros países do mundo, as principais emissoras de TV são públicas e financiadas pelo povo. Quem financia a BBC é o cidadão inglês que paga uma taxa anual. Então por isso, o compromisso da BBC não é com o governo ou com um grande grupo industrial e sim com a socieade. No Brasil, você deve estar careca de saber que o compromisso da TV aberta não é com você e nem com a sociedade, e sim com os anunciantes.
Bom, hoje venho aqui para falar sobre um excelente documentário chamado “What makes us good or evil ?”
O programa transmitido em 07 de Setembro de 2011 no canal BBC Horizon tenta responder a uma inquietante pergunta: O que nos faz ser bom ou mal ? Buscando por respostas, o programa foi ouvir alguns dos maiores estudiosos do mundo em pessoas realmente más: Os cientistas que estudam as mentes de assassinos psicopatas.
O programa é interessantíssimo e mostra várias pesquisas científicas que vão desde o estudo do instinto moral em pessoas, passando por testes para saber se bebês já nascem ou não com disponibilidade para a maldade até as sofisticadas pesquisas genéticas que deram origem à descoberta do gene responsável pela maldade. O programa é interessante também ao abordar uma questão bastante discutida hoje que são os “psicopatas de sucesso” e a forma como eles irresponsavelmente dirigem grandes empresas.
Disponibilizo no fim do post o programa legendado, mas antes farei um review sobre o mesmo.
Podemos Nascer Maus ?
Uma pesquisa mostrada no programa tenta responder a uma inquietante questão: Bebês podem nascer maus ?
A pesquisa dos cientistas Karen Wynne e Paul Bloom, da Universidade de Yale nos Estados Unidos, teve como objetivo descobrir a origem da moralidade e a origem do bem e do mal. Seria possível alguém já nascer mau ou bom ? Um bebê já poderia nascer com um senso moral ? Com bons ou maus impulsos ? Se sim, como isso poderia se desenvolver no senso adulto de certo e errado ?
Para tentar desvendar essas complexas questões, os cientistas criaram uma peça sobre moralidade na qual bebês voluntários assistiriam. A peça consistia em 3 bonecos dispostos um ao lado do outro. O boneco do meio tinha uma bola na qual brincava. Em dado momento ele passa a bola para o boneco da esquerda, que brinca com a bola e devolve para o boneco do meio. Com a bola novamente em mãos, o boneco do meio brinca e passa a bola para o boneco da direita. O boneco da direita pega a bola e foge com ela. O que os cientistas queriam saber é qual boneco cada bebê escolheria, o da esquerda ? Ou o da direita ?
“Para um adulto que vê isso, a pessoa que devolve a bola é boa. A pessoa que foge com a bola é um chato. Para um adulto você apenas pergunta: Qual é o cara bom e quem é o cara mau ? Mas com um bebê você não pode fazer isso. O que você faz é deixar a criança escolher,” diz o pesquisador Paul Bloom.
A pesquisa mostrou que 70% dos bebês escolheram o boneco “bom”, e segundo os pesquisadores, isso é um indício de que esses bebês são atraídos pela bondade e que isso é um reflexo de um sentimento moral.
“Esses não são efeitos sutis, pelo contrário, os bebês analisam tais cenas de forma rica e poderosa e respondem de acordo,” diz Paul Bloom.
Mas enquanto aos 30% dos bebês que escolheram o boneco “mau” ? Seriam esses bebês, pessoas com uma pré-disposição para a maldade ?
“A explicação sexy é que esses bebês são psicopatas, bebês que vêem o mundo de forma diferente e que realmente preferem o cara mau. Acho que isso é uma possibilidade lógica. Mas acho que é mais provável que, em qualquer experiência que você faça, se você testar 100 bebês, 20 agirão de forma diferente não importa o que. Pode ser porque eles adormecem ou se distraem. É uma questão em aberto, se os bebês que escolhem o boneco mau são um tipo diferente de bebês, com um código moral diferente, ou se isso é apenas uma margem de erro que você obtêm em qualquer experimento,” diz Paul Bloom.
Para o cientista, suas pesquisas sugerem que nós, seres humanos, já nascemos com senso moral.
Psicopatas serial killers
O instinto natural do ser humano é não fazer o mal, como podemos explicar então aqueles que parecem ser desprovidos de bondade ? Que não pensam duas vezes em tirar uma vida ? Essas são algumas indagações do programa ao entrar no sombrio mundo dos psicopatas serial killers. Essa, talvez, seja a parte mais interessante do programa. Para tentar desvendar uma mente que tortura e mata sem nenhum pingo de remorso, o programa entrevistou grandes autoridades no assunto, uma delas é o psicólogo canadense Bob Hare. A história de Bob é, no mínimo curiosa. O recém-formado em psicologia não conseguia um emprego. Depois de tanto correr atrás, conseguiu um emprego de psicólogo em uma penitenciária canadense. Lá ele ficou cara a cara com os mais terríveis psicopatas que se possa imaginar. Virou um apaixonado nessas mentes e hoje é uma das maiores autoridades na área.
Bob começou a estudar a fundo essas pessoas e foi um dos primeiros a realizar experiências escaneando cérebros de psicopatas. Na época, o que ele descobriu, chocou a todos. Psicopatas eram desprovidos de emoção e não tinham empatia para com outras pessoas. A pesquisa de Bob Hare, publicada em meados dos anos 80, é até hoje fonte de pesquisa.
Talvez o ponto alto do programa seja a história do neurocientista californiano Jim Fallon e a forma como ele“caiu” no mundo dos psicopatas. Jim é um especialista em distúrbios clínicos padrões que passou a vida inteira pesquisando anomalias cerebrais em pessoas com esquizofrênia e depressão. Em um certo dia, alguns colegas o pediram para analisar scans cerebrais de algumas pessoas, mas não disseram quem eram aquelas pessoas ou se elas sofriam de algum distúrbio. Olhando os scans, Jim fallon notou algo que achou fascinante.
“Um certo grupo tinham sempre uma lesão no córtex orbital, acima dos olhos. Outra parte que parecia não funcionar bem era a parte frontal do lobo temporal que abriga a amígdala, o local onde nossas reações se tornam diferentes das dos animais. Achei extraordinário. Separei esses scans e disse para meus colegas: Esses são diferentes. E quando formos ver, aquele grupo de scans pertenciam a assassinos.”
Jim Fallon descobriu que tais lesões presentes nos cérebros de psicopatas assassinos eram cruciais para o controle dos impulsos e das emoções, o que acabou confirmando os estudos do psicólogo canadense Bob Hare publicado anos antes. E mais, tais lesões poderiam ser a resposta científica para entender poque psicopatas podem ser levados a comportamentos extremos.
“Para chegar ao ponto de ficar satisfeito ao alimentar a amígdala, alguns desses psicopatas fazem coisas extraordinárias. Um pode voar até Las Vegas e ficar bêbado, outro pode sair e ficar com várias prostitutas, cheirar cocaína ou, o mais extremo, matar e matar pessoas, repetidamente.” Diz Jim Fallon.
Mas essa descoberta de Jim Fallon fez surgir mais dúvidas do que respostas. Existiriam outros fatores, além dessas lesões cerebrais, que poderiam levar um psicopata a matar ? E mais, se o cérebro de um psicopata é diferente, o que originaria essas diferenças ? Seriam os genes ? Genes ligados à violência ?
A resposta veio em 1993 com a análise do DNA de uma linhagem de psicopatas assassinos. Era a descoberta do gene MAO-A, o gene “guerreiro.”
“Isso foi muito empolgante porque implicava fatores específicos que contribuem para a psicopatia. E também porque isso sugere que essa área de pesquisa poderia gerar frutos.” Diz Bob Hare.
A descoberta deixou os cientistas empolgados, tão empolgados que, em uma reunião de família, Jim Fallon comentou com os familiares sobre suas descobertas. Ao ouvir os comentários do filho sobre cérebros de psicopatas assassinos, sua mãe lhe disse algo que o deixaria intrigado.
“Você já ouviu falar de Lizzie Borden ?” Perguntou a mãe do cientista.
“Não!” Respondeu Jim.
“Ela é sua prima!” Disse a mãe do cientista.
Lizzie Borden é a pivô de um dos mais famosos casos de assassinatos ocorridos nos Estados Unidos. Ela foi acusada de assassinar o pai e a madrasta em 1892 a golpes de machado. Lizzie Borden foi julgada e absolvida do duplo assassinato. O caso nunca foi solucionado e tornou-se um dos crimes mais misteriosos da história americana.
O neurocientista Jim Fallon não sabia mas ele era descendente direto de Lizzie Borden. Ao aprofundar mais no assunto com sua mãe, Jim Fallon descobriu que sua família era repleta de assassinos, ele descobriu 16 assassinos dos quais ele descendia direto, da família do seu pai. E foi ai que ele decidiu escanear o cérebro de toda sua família.
“Haviam muitas, muitas páginas e tudo parecia normal. Fantástico. E então eu fui para o último. Esse parecia muito anormal. Essa tomografia em particular não tinha atividade no córtex orbital nem no lobo temporal. Todo o sistema límbico não estava funcionando. Então eu disse: Meu Deus, esse é um desses assassinos. Tem o mesmo padrão que um assassino. Quando olhei para o código tive um choque: Era a minha tomografia!”
Essa descoberta de Jim Fallon foi muito importante no estudo de mentes psicopatas, pois abriu espaço para a descoberta do “terceiro ingrediente”. O ingrediente final que faria com que psicopatas se tornassem assassinos.
“Nos anos 90, passei a investigar cérebros de assassinos psicopatas. E vi que todos seguiam o mesmo padrão: um dano no córtex órbito-frontal, região cerebral bem acima dos olhos associada com tomada de decisão e conduta ética.
Há uns 4 anos, soube de ao menos 16 assassinos na família do meu pai. Um homem foi enforcado em 1673 por matar a mãe, e uma mulher, acusada de matar o pai e a madrasta com um machado em 1892 (Lizzie Borden). Fiz então tomografias do meu cérebro e vi que quase não há atividade no meu córtex órbito-frontal. Na mesma época, fiz testes genéticos em minha família para saber o risco de cada um desenvolver Alzheimer. E descobri que também compartilho com psicopatas o gene guerreiro, que pode deixar o cérebro da pessoa insensível ao efeito calmante da serotonina.
Tenho 2 ingredientes comuns aos psicopatas. O dano no córtex órbito-frontal e o gene guerreiro. Mas não tenho o terceiro: Abuso severo na infância, que é o gatilho necessário para ligar o gene guerreiro. Minha infância foi muito benevolente e cercada de amor. Após dar à luz ao meu irmão mais velho, minha mãe teve 4 abortos naturais. Quando cheguei, me trataram como um garoto de ouro. Se tivesse sido tratado normalmente, talvez fosse hoje meio barra-pesada. E, se fosse abusado, creio que não teríamos esta conversa agora.”
Jim Fallon escapou por pouco, mas estamos carecas de saber que a grande maioria dos psicopatas não matam e nem são criminosos, ao contrário, são executivos, políticos, empresários bem sucedidos que manipulam os que estão em sua volta para se darem bem na vida.
“Alguns psiquiatras me chamam assim. Mas nunca pensei em mim dessa forma. Quando vi toda a análise de meu cérebro e meus genes, pedi a vários colegas que fossem francos comigo e com minha família sobre meu lado escuro. Não acho que sou psicopata. Não tenho um charme superficial. Sou honesto e realmente trato bem os demais, do mesmo jeito que trato minha família.” Diz Jim Fallon
Psicopatas de Terno
Os “psicopatas de terno” também são tema do documentário.
Segundo um estudo conduzido pelo psicólogo de Nova York Paul Babiak, 1 em cada 25 líderes de negócios no mundo pode ser um psicopata. Um número alto voce deve estar pensando, mas não é muito difícil de entender o porque de a maioria de nossos líderes serem psicopatas. Eles disfarçam, manipulam pessoas, e assim, conseguem altos cargos em empresas e governos.
Como visto acima, as pessoas podem nascer com pré-disposição genética para ser um psicopata. O que fará com que ele se torne um criminoso ou não é a sua infância. Uma infância feliz pode ser a resposta para os pequenos psicopatas que adentram ao mercado de trabalho.
“Psicopatas realmente não sao o tipo de pessoa que você pensa que são. Eu encontrei meu primeiro psicopata há pouco mais de 25 anos. E não foi alguém em uma prisão. Foi alguém que estava trabalhando em uma empresa onde eu prestava consultoria. A metade das pessoas achavam que ele era um líder maravilhoso. A outra metade achava que ele era o oposto. Pensavam que ele era a encarnação do mal. Fiquei intrigado e me lembro de ligar para Bob Hare. No final da conversa, nunca me esquecerei, ele disse: Sim, você achou um!” Diz no documentário o psicólogo Paul Babiak.
Paul Babiak diz que os “psicopatas de sucesso” tem uma tendência natural em serem charmosos e carismáticos. Segundo ele, você poderia estar vivendo com um, ou estar casado com um a 20 anos ou mais e mesmo assim não saber que ele é um psicopata.
Paul Babiak diz ainda que psicopatas são horríveis profissionais, mas compensam suas gestões desastrosas encobrindo suas fraquezas através dos seus charmes naturais. Isso torna quase que impossível distinguir um líder genuinamente talentoso de um psicopata.
“Quanto maior é a psicopatia, melhor eles são vistos. Mas se você olhar o seu desempenho profissional real, verá que é horrível. Você deve pensar em psicopatas como pessoas que tem à sua disposição um repertório muito grande de comportamentos. Assim eles podem usar a manipulação, o charme e a intimidação quando necessários. Eles podem dizer o que você está pensando, eles podem olhar para sua linguagem corporal, eles podem ouvir o que está dizendo, mas o que eles realmente não podem fazer é sentir o que você sente.”
O documentário termina com um inédito caso de um advogado norte-americano que, ao defender um psicopata assassino no tribunal, introduziu a teoria de interação gene-ambiente na audiência. Em outras palavras, o psicopata não poderia ser condenado a pena de morte pois, segundo o seu advogado, ele nasceu com o gene guerreiro. Como termina essa história ? Só vendo abaixo.
“Jeffrey Dahmer e Ted Bundy, dois infâmes serial killers. Quando você olha para as fotos vê pessoas normais. Pois esse era o ponto forte deles. Eles pareciam pessoas normais quando estavam no meio da sociedade”
Fonte: Aprendiz Verde
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